O jeito Curupira de andar

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Armando Correa de Siqueira Neto*

Quando temos a certeza de que só andamos para frente, e a referência evolutiva baseia-se tão somente nos avanços tecnológicos, é ai que o autoengano demonstra claramente ter tomado conta da razão. Se antes ainda havia certo bom senso que combatia as exageradas fantasias pessoais, agora, contudo, a ilusão revestiu a sociedade com a sua lona e o show, ao que tudo indica, não tem hora para acabar. Enorme porção das pessoas, por exemplo, possui uma educação esfarrapada. Mas dá para levar assim mesmo! Afirma-se. Afinal, para que serve o saber se o mercado de trabalho exige títulos? A ética, sobretudo na esfera política e no ‘jeitinho’ popular de arranjar as coisas, foi praticamente sorvida pelo vampiro da corrupção. Ninguém faz nada? É claro que faz, ri sentado enquanto assiste à televisão e toma cerveja. Quer mais? O consumismo não apenas diz o que vestir ou o que comer, ele dá as cartas em relação ao modo de se relacionar socialmente, haja vista ‘ter’ e ‘ser’ significarem a mesma coisa na nova linguagem das relações humanas. O dinheiro manda, obedece quem tem dívida! Ou ansiedade. Enfim, fazer é melhor do que pensar. O negócio da reflexão e da consciência, conclui-se, é coisa dos livros os quais não lemos. Deus me livre! Só ouvimos falar neles.

É o jeito Curupira de andar. Os passos são sempre para frente, mas as pegadas mostram o contrário, pois os pés estão voltados para trás. Para piorar, cremos, sem hesitação, que somos a geração do futuro. Bravo! De modo imperceptível, o autoengano trabalha incessantemente e nos faz crer melhores do que somos. Porquanto pergunto, sem defender qualquer proposta de retrocesso: já não foi bem melhor a qualidade da educação no passado em relação ao que se percebe no presente? Não houve mais honestidade ontem do que hoje, mesmo quando a malandragem percorria alguns gabinetes parlamentares? E quanto ao consumismo, por que cedemos tanto à roda escravista do sistema Compre-Mesmo-Sem-Precisar? Achamos natural trocar muitos bens em pequenos intervalos de tempo! Então, tornamo-nos reféns de nós mesmos a partir da hipnose arquitetada e promovida por meia dúzia de pessoas interessadas em tal sonolência e enquadramento? Somos cativos do astuto esquema psicológico, pois temos que trabalhar cada vez mais para manter o status que exige tais compras, do contrário nos sentiremos inferiores, pobres diabos da sociedade. Assim o fazemos e, ironicamente, vivemos a reclamar pelas dificuldades imputadas pelos gastos frequentes. Pior: para alguns, o consolo é ver-se de pé no páreo diante dos outros que tombam ao longo da funesta corrida que oferece exaustão e constante falta de ânimo por nunca ser possível ver a linha de chegada. Ignoramos a nossa falta de reflexão e visão acerca dos males que nos afligem. Lançamos a culpa sobre os outros e as circunstâncias; tudo que esteja além de nós. Nunca a nós próprios. É o jeito Curupira de andar, acreditando que se avança sem notar as pegadas a dizer o contrário. Será que estamos dando os passos na direção do verdadeiro desenvolvimento, capaz de resultar em autonomia e sustentabilidade?

 *Armando Correa de Siqueira Neto é psicólogo (CRP 06/69637), palestrante, professor e mestre em Liderança. Coautor dos livros Gigantes da Motivação, Gigantes da Liderança e Educação 2006. E-mail: [email protected]

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