Médicos falam sobre o surto de ebola na África e se há risco para o Brasil

263

ebola-patientOs Estados Unidos anunciaram o envio de 50 especialistas em saúde pública a países africanos que estão sofrendo com o vírus ebola. O surto de ebola que está atingindo a África atualmente é o mais devastador de todos os tempos. Já matou centenas de pessoas. Conheça a luta dos médicos para salvar vidas em um cenário de extrema dificuldade. E saiba também se o Brasil está preparado para o caso de o vírus ebola aparecer no país. O ritual de gente protegida e desinfecção no enterro das vítimas de ebola é um choque na cultura local, mas essencial. Os funerais no oeste da África envolvem as famílias beijando e tocando os corpos por horas seguidas. E assim uma comunidade inteira era contaminada, a partir de um morto.

Pior epidemia de ebola já registrada

Esta é a pior epidemia de ebola já registrada, tanto em número de casos quanto em mortes. Começou em fevereiro, no interior da Guiné, matando 346 pessoas. Em dois meses, atingiu a capital, Conacri. Em maio, a epidemia chegou a Serra Leoa, deixando 252 mortos. Em meados de junho, o vírus se espalhou para a Libéria e matou 227 pessoas. No mês seguinte, julho, foi a vez da Nigéria anunciar o primeiro doente. Já existem casos não confirmados em Gana, Mali e na Costa do Marfim.

Cientistas acreditam que o vírus viva nos morcegos da fruta

O vírus ebola foi descoberto apenas nos anos 70, nas florestas da África. Os cientistas acreditam que o vírus viva nos morcegos da fruta, que ocupam as cavernas da região. Nele o vírus não provoca doença. Mas uma fruta meio comida por um morcego e encontrada por outro animal pode dar início à epidemia.

Primatas são muito vulneráveis. Em apenas uma epidemia, mais de cinco mil gorilas morreram. Humanos contraem o vírus ao comer frutas ou caça contaminadas, ou ao manipular um animal morto.

Vírus passa de uma pessoa para outra entrando pelas mucosas

O vírus passa de uma pessoa para outra, entrando pelas mucosas, como os olhos, por exemplo. Por isso os médicos usam tanta proteção.

Em uma vila no interior da Guiné, durante um mês, a médica brasileira Raquel Esteves Soeiro esteve na linha de frente do combate à doença. Todos os médicos e enfermeiros usam roupas de proteção de borracha, cobrem até os olhos.

“Nenhuma parte do corpo fica exposta. E a gente ainda põe um avental na frente, porque se por acaso o paciente que estiver internado tiver vomitando ou tiver diarreia e a gente tiver esse contato com secreção vai ficar ali no avental não vai chegar nem no macacão de borracha.”, explica a média Raquel Esteves Soeiro, do Médicos Sem Fronteiras.

A cada entrada e saída, um rito. Tudo é desinfectado com cloro. São quase cinco minutos só para tirar a roupa de proteção de maneira adequada.

Hoje, a maior parte dos doentes é atendida pela organização Médicos Sem Fronteiras. O brasileiro Paulo Reis está em Serra Leoa, onde a epidemia está mais forte hoje.

“A situação é muito grave. Muitas pessoas contaminadas, a doença está se espalhando. É uma doença que está destruindo muitas famílias. E isso demanda muitos recursos por parte da nossa organização.”, lamenta o médico Paulo Reis, do Médicos Sem Fronteiras.

Médicos africanos também foram infectados

Esta semana a situação ficou ainda mais grave. O governo de Serra Leoa decretou estado de calamidade. Por telefone, o brasileiro desabafou: “Um projeto normal, mesmo que você veja muitas pessoas morrendo em uma emergência, a maioria sobrevive. O ebola, infelizmente, a maioria não sobrevive”, diz Paulo Reis.

Por falta de material e treinamento, muitos médicos africanos também foram infectados. “Está mais complicado. Agora a gente está com um problema, alguns funcionários da saúde do governo ficaram doentes também, então eles estão fechando o centro deles. Então basicamente está mais complicado. Agora o único centro é o nosso. Então, as coisas não estão indo muito bem por enquanto”, conta o médico Paulo Reis. A Organização Mundial de Saúde fez um alerta para o agravamento da epidemia, o risco é no mundo todo, um passageiro assintomático que viaje carregando o vírus. Mas isso não significa que haverá epidemia.

Infectologista fala sobre o risco do ebola chegar ao Brasil

O ebola vai chegar ao Brasil?
Otília Lupi, infectologista: Tem uma chance grande da gente ter casos e certamente a gente vai investigar casos suspeitos.
Qual é o risco que nós temos que isso se torne uma epidemia grave como está nesses países Serra Leoa, Guiné e Libéria?
Otília Lupi: Muito pequena. Praticamente nenhum. A gente não precisa ficar tão assustado assim. Está fora do controle em uma pequena região de muito difícil controle na verdade de qualquer doença. Esse é apenas mais uma.

Esta semana os Estados Unidos mandaram buscar um médico e uma missionária americanos, que foram infectados tratando pacientes na África e já estavam bastante doentes.

Médicos garantem que o Brasil está preparado para evitar epidemia

Cuidados por médicos protegidos, os americanos levam o ebola para o país, sabendo que podem impedir que o vírus se espalhe. O Brasil também está preparado para evitar uma epidemia, garantem os médicos da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio. Nossa rede de prevenção e contenção de epidemias que está entre as melhores do mundo.

A gente precisa ter medo de ebola?
Otília Lupi: A gente deve ter muito respeito. A gente deve se preparar com muita seriedade, porque certamente vai ser o desafio de lidar com o medo da população como um todo. Porque tem todo um imaginário por trás disso. Mas a gente tem que saber também que a gente tem uma estrutura que é capaz de vencer esse desafio. Um mito é que o contágio acontece pelo ar.

Se eu estivesse contaminada com o vírus, eu poderia só na conversa passar esse vírus para você?
Otília Lupi: Na verdade, não. Não é assim. Precisa realmente um contato. Nesses países até se aboliu o hábito de se abraçar as pessoas, de se beijar.

“É um vírus bem contagioso, ele pega por secreção, então é vômito, diarreia, suor, sangue, lágrima”, diz Raquel.

Sintomas parecidos com a gripe ou dengue hemorrágica

O ebola começa com sintomas parecidos com a gripe ou dengue hemorrágica: dor de cabeça, dores no corpo, fraqueza, febre alta, dor de garganta. Em seguida vem vômitos, diarreia, coceiras e manchas no corpo. Fígado e rins são afetados. Nos casos mais graves, há hemorragia, tanto nos órgãos internos como sangramento pelo nariz e pela gengiva. Quanto mais avançada a doença, maior a concentração de vírus e mais fácil o contágio.

Não há remédio contra o vírus que atinge igualmente adultos e crianças.

“Essa foi a parte mais difícil. Porque a criança se ela é suspeita, a mãe não pode entrar com ela, ela pode se contaminar”, diz Raquel.

Diagnóstico precoce aumenta muito as chances de cura

Como numa gripe, o diagnóstico precoce e cuidados básicos como manter o paciente hidratado e alimentado, aumentam muito as chances de cura. Na epidemia de 1995, no antigo Zaire, a mortalidade era de 90%. Hoje está em 56%.

“Não é sempre que o paciente vai conseguir sair vivo do centro de tratamento. Então quando a gente pode dar uma alta, é uma alegria”, conta Raquel. O adolescente recebe a notícia de que está curado. Antes da alta tem um banho de água clorada e roupa nova. A velha será queimada.

“E aí fica sempre alguém da equipe esperando do lado de fora, do centro de tratamento, para poder abraçar esse paciente e mostrar que ele não é mais contagioso, que ele não vai mais contaminar ninguém, para ele não ficar estigmatizado pela comunidade”, explica Raquel.

Antes de ir embora, um rapaz é treinado para ser agente de saúde. A cura o deixou imune a esse vírus. É como ele estivesse vacinado. A felicidade do rapaz é distribuída em acenos na chegada à vila. O atestado de alta é exibido com orgulho. Afinal, ele enfrentou a morte, e venceu.

FAÇA UM COMENTÁRIO

Por favor digite um comentário
Por favor digite seu nome aqui