Não sei quantas vezes tenho ouvido, por parte dos homens, uma queixa que penso ser honesta, na medida de toda a sinceridade humana. Ouço uma espécie de reclamação, ou antes, observação, sobre a conduta feminina. Descrevem-nas indecisas, voláteis de pensamento. Buscam expressar o quão distantes estamos de entender o que realmente pensa uma mulher. “A gente não sabe o que elas querem”, me diz um. “Ora querem ir a direita e ora seguir em frente, mas não sem antes desejarem conhecer o quê há a esquerda”, resume outro. “Quanto mais nos dedicamos a elas, mais elas nos maltratam. A gente tem é que esnobá-las”, sugere alguém.
Depois de muita conversa, chega-se a um ponto aparentemente intransponível. São questionamentos que resumem aquela meia hora de lamentações e incertezas. Afinal de contas, o que as mulheres querem dos homens? Ou, o que realmente buscam num relacionamento?
Não abro esta questão inocentemente. Sei de antemão a incapacidade de se chegar a um fim, a uma resposta definitiva, pois há entre homens e mulheres uma curiosa relação de atração/repulsa, certamente digna de ser pesquisada a fundo. Eis um mistério interessante e antigo.
Porém, por hora, contento-me em contar um caso ocorrido comigo num dia de corrida, que talvez possa ajudar a resolver parte dos questionamentos levantados, ou senão, aumentá-los.
Afinal, não há mistério que não se descubra algo a respeito e que não se adicione, ao mesmo tempo, mais dúvidas… É o caso do Big Bang. Até 1930, pouquíssimo sabíamos sobre a origem do universo. Até que Edwin Hubble descobre que o universo estava em expansão. Daí a concluírem o Big Bang foi um pulo. Pronto: passamos a conhecer muito mais sobre o grande mistério da origem da vida. Todavia, outras grandes questões, sobre o mesmo mistério, passaram a nos perseguir, feito um grande e carnívoro ponto de exclamação. Por exemplo, qual será o destino final do universo? Continuará a expandir-se ou voltará contraindo-se? Como entendermos a questão relativa à “viagem no tempo”? Existe vida inteligente fora da terra? Perguntas e mais perguntas…
E não pensem que este é um caso isolado. Igualmente assustadoras foram as exclamações feitas pela princesa Turandot, alcunhada de bela e fria no amor. Todos os seus muitos pretendentes deveriam responder a três perguntas. Se acertassem, ganhariam o seu amor; caso errassem, seriam decapitados. Muitos perderam suas cabeças neste jogo. Até que Calaf, um príncipe persa, conseguiu responder as perguntas.
Narração que me faz refletir sobre qual sentimento Turandot teve no momento em que Calaf lhe responde corretamente às perguntas. Provavelmente fosse certo para ela que nunca alguém acertaria e, portanto, ela jamais seria contrariada. Mas quando lhe respondem acertadamente, teria se sentido como houvesse perdido o controle da situação, fazendo-a sentir fragilizada. Algo que ela não deve ter gostado. O seu prazer era sentir-se desejada e controladora não somente dos seus, mas também dos sentimentos masculinos. Calaf acaba com toda esta artimanha feminina.
Quanto à outra história, a que eu queria contar, começou num dia de corrida. Deu-se o acontecido enquanto eu realizava uma caminhada acelerada com vista a me aquecer. As protagonistas foram duas belas jovens, bem vestidas, altas, uma morena outra loira. Trajavam roupas esportivas, destacando seus admiráveis corpos.
Elas andavam à frente. Conversavam. Era um daqueles momentos especialíssimo, no qual duas mulheres se juntam oportunamente para expressarem suas impressões e sentimentos recentes. Com a empolgação, normalmente falam muito e alto. E foi isso o que me permitiu escutar alguma coisa. A primeira – a loira – dizia:
— Outro dia um cara me parou na rua e me pediu o celular emprestado. Cê acredita? Folgado!
— Mesmo? Pra quê?
— Então… Aí eu perguntei para ele por quê. Se ele tava passando mal. Aí ele disse que precisava ligar para mãe dele. Aí eu perguntei para quê. Aí ele me respondeu que era urgente, porque havia acabado de encontrar a nora que sua mãe desejava.
— Nossa… E aí?
–Aí eu virei às costas e fui embora na hora. Aff! Que cara, nada a ver… Ninguém merece.
Bem, a história continuou, mas eu não sei de mais nada, porque eu as ultrapassei e não pude mais ouvi-las. Tinha que começar a corrida. Durante o exercício fiquei a analisar o caso, sem poder chegar a muitas conclusões. Pude apenas inferir que a cantada do rapaz não era de toda ruim. Ao menos valeria um sorriso de simpatia ou, no mínimo dos mínimos, o silêncio amigável. Eu a achei boa. Não creio que a moça também não tenha gostado: quem não desejaria ser uma pessoa ideal e admirada?
Agora, escrevendo isso, tenho certeza de que o cara deveria mesmo é ser bem feio.